Mafia
José Oliveira
São movediças, as areias sobre as quais assentam os financiamentos da generalidade dos partidos políticos. Recordo um comentário de Medina Carreira feito num dos seus comentários de tv poucos anos antes de ter falecido; contava ele que perguntou a um seu amigo, conhecedor dos meandros de funcionamento de um dos partidos da chamada alternância, qual era a percentagem de fundos angariados mediante favores de saco azul que efectivamente entravam nos cofres do partido e quanto ficava retido no bolso do angariador, à laia de comissão. Resposta: 20% para o partido, 80% para o próprio. Não havia engano? Inversão nas percentagens? Não; oitenta por cento para o agiota. Incrédulo, Medina abordou outro amigo, mas desta vez do outro partido da alternância. E a resposta foi idêntica, igualzinha nas percentagens.
Veio-me isto à memória, a propósito das projectadas alterações à regulamentação do financiamento dos partidos, designadamente a vantagens em sede de IVA, penalizadoras de todos os contribuintes. E é inaceitável que se tenha tentado escamotear a discussão do diploma, usando identificações de código, discutindo pela calada da noite, aproveitando a distracção dos portugueses e dos meios de comunicação, que se adivinhava entretidos com as minudências do natal e fim de ano. E nem quero imaginar que já fosse previamente conhecida a data da cirurgia (dita de emergência) do presidente da República…
Contudo, Afigura-se-me muito mais reprovável a existência dos esquemas de angariação de fundos conforme o relato de Medina, pelo que encerram de sórdido a vários títulos, na certeza de que nenhuma empresa ou cidadão dá milhões (de saco azul…), com o benigno espírito de ajudar ao funcionamento da democracia. Acabará por sair muito cara a todos nós, tanto a parcela dos 20% que engordam venalmente a conta do partido (venalmente, porque entrados pela porta do cavalo), como os 80% que entram ainda mais venalmente no bolso do agiota.
Sabendo que os maiores gastos dos partidos residem nas campanhas eleitorais, sanear-se-ia uma fatia significativa desse cancro que é o agiotismo, se houvesse a coragem de substituir a propaganda como hoje a conhecemos, por equivalente empenho em utilização de tempos de antena e espaços de imprensa.
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